Coisas que me dão na telha, de vez em quando, e que quero deixar registradas, nem que seja num blog.







segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Lixo extraordiário

lixo extraordinário

     Estou de volta das merecidas férias, desde domingo. Cheguei a tempo de ver o Grêmio ganhar do Cruzeirinho e ir pra final do primeiro turno do Gauchão contra o Caxias. Ainda bem que, de tão cansado da viagem, dormi antes da transmissão da cerimônia de entrega dos Oscars. É um programa muito chato. A gente passa o tempo todo ouvindo duas pessoas falando em inglês, ao mesmo tempo em que outras duas falam em português. Acaba-se não entendendo o que dizem uns e o que falam outros. Mesmo que entendesse, aquelas piadas dos americanos só têm graça pra eles. Além disso, ainda tem o José Wilker de Almeida, aquele antigo locutor de rádio, nascido há 66 anos, no Ceará, fazendo comentários sobre o que ele acha dos filmes, dos atores, dos diretores, etc.
     Uma curiosidade sobre o Oscar: há duas versões para que a estatueta tenha esse nome. A primeira dá conta de que o nome fora inventado por Margareth Herrick, secretária-executiva da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, que, ao ver a pequena estátua, comentou que se parecia muito com seu tio Oscar. Um jornalista (sempre tem um metido metido na história) presente no momento teria publicado o fato, dando origem ao nome do prêmio. Outra versão diz que a atriz Bette Davis o teria apelidado assim, devido à semelhança da estatueta com seu primeiro marido. De qualquer modo o apelido pegou de tal maneira que até hoje é o nome pelo qual o Academy Award ou Prêmio da Academia é conhecido mundialmente.
     Não sei se são verdadeiras as versões, mas estão publicadas no Wikipedia, no verbete Oscar.
     Sempre tem um filme ou curta ou documentário brasileiro concorrendo ao Oscar. Espero sinceramente que seja por mérito e não por política. Neste ano foi a vez do documentário “Lixo Extraordinário”, dirigido pela cineasta Lucy Walker. O documentário mostra a arte de Vik Muniz, um artista cujas obras são reproduções de criações de outros artistas, mas em material inusitado, neste caso, o lixo. O trabalho de Vik Muniz pôde ser visto na abertura da novela Passione, da Globo.
     O sinopse do site oficial de Lixo Extraordinário diz que o documentário foi filmado ao longo de dois anos (agosto de 2007 a maio de 2009), acompanhando o trabalho do artista plástico Vik Muniz em um dos maiores aterros sanitários do mundo: o Jardim Gramacho, na periferia do Rio de Janeiro. Lá, ele fotografa um grupo de catadores de materiais recicláveis, com o objetivo inicial de retratá-los. No entanto, o trabalho com esses personagens revela a dignidade e o desespero que enfrentam quando sugeridos a reimaginar suas vidas fora daquele ambiente. A equipe tem acesso a todo o processo e, no final, revela o poder transformador da arte e da alquimia do espírito humano.
     Enfim, mais uma vez um trabalho cinematográfico brasileiro fica só na indicação.
     Pois bem, nessas minhas férias eu também poderia ter feito um documentário sobre lixo, sem a pretensão, é claro, de ser indicado ao Oscar.
     Há um ano, publiquei neste espaço um relato sobre as férias de 2010, em Bombinhas, Santa Catarina. No meio de um parágrafo fiz referência ao lixo que fica na orla, deixado por veranistas de estados e países vizinhos: [...] areia cheia de latinhas de cerveja, sacos plásticos, cocos verdes e saídas de esgoto contendo o que argentinos, gaúchos e paranaenses não aproveitam no organismo.
     Passado um ano, depois de muito se falar em lixo na mídia, depois de muita campanha de conscientização sobre o lixo, lá estava ele em maior intensidade, não só na beira da praia, mas nas ruas de Bombinhas: latinhas de cerveja e refrigerantes, garrafas long neck, garrafas pet, sacos plásticos, embalagens diversas, restos de construção, absorventes femininos e pulgas, muitas pulgas.
     Sim: pulgas! Além de lixo, proliferam pulgas em Bombinhas, que está repleta de cães abandonados. Por todos os cantos da cidade vêem-se aqueles animaizinhos assustados, com o rabo entre as pernas, olhando-nos de soslaio, pedindo uma ajuda ou esperando serem corridos. Ao lado do prédio em que ficamos, duas cadelas de rua deram cria: uma delas a seis filhotes; a outra, a três. Eu e minha mulher passávamos por ali com nossa mascote, a Lila. Bastaram dois dias para que as pulgas invadissem o corpo de Lila. Em casa ficava a outra, nossa gata chamada Wanda, que também foi infectada pelas pulgas que a Lila inadvertidamente trouxe da rua.
     A poucos metros havia uma clínica veterinária onde encontramos a solução para o resto do veraneio. Todos os dias, contudo, fazíamos uma varredura no corpo das duas e catávamos pulgas mortas ou estonteadas pela ação do FrontLine. Quanto a nós, tivemos sorte. Apenas os mosquitos gostaram do nosso sangue.
     A cidade também está cheia de terrenos baldios mal cuidados, com muita vegetação crescida, excelente palco para lixo, pulgas, carrapatos, ratos e outras pragas.
     Não tirei nenhuma foto dos atores do documentário que acabei não fazendo. Acho que foi de vergonha. Todo mundo diria que sou um idiota em veranear num paraíso transformado em lixo extraordinário.

.:: o ::.

     Fica um pedido às autoridades de Bombinhas: que pelo menos de dezembro a março contratem um serviço de varrição de ruas; que instalem um centro de zoonoses; que multem os proprietários que não mantêm seus terrenos e calçadas em condições; que dêem um uso social ao IPTU que arrecadam anualmente. Para se ter uma ideia, um apartamento de 140 m², com dois dormitórios, paga um IPTU de R$ 600,00. E lá têm muitos apartamentos assim.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Homenagem à mãe dos meus filhos

o dia da morte

O Dia da Morte - William-Adolphe Bouguereau

     Ela é esperada, mas sem a ansiosa expectativa de uma criança antes do Natal. Ela é esperada, mas nunca se quer que ela chegue. Ela é esperada, mas, quando chega, nada preenche, só deixa um vazio.

     Ela é esperada até pelos que não a esperam. Chega de repente, sem aviso, toma conta do espaço que era da vida até momentos atrás. Os que a esperam, no entanto, lutam, muitas vezes por anos a fio, para que ela não chegue no dia que não marcou pra chegar.

     Ela é esperada, mas, quando chega, pega de surpresa aos que ainda vão continuar a esperá-la.

     Ela é o fenômeno natural que desde o início da humanidade ainda provoca discussões nos campos da religião e da ciência, suscitando opiniões diversas. Desde o princípio dos tempos, os homens a tem classificado como misticismo, magia, mistério, segredo. Os céticos, contudo, atribuem a ela apenas o cessar da consciência, quando o cérebro deixa de executar suas funções.

     Sim. É dela que estou falando: da morte, óbito ou falecimento; desencarne ou passamento; decesso, defunção, exício, fim ou finamento; libitina, parca, trânsito ou perecimento. Ela vem, seja qual for sua crença ou descrença; seja qual for seu sotaque ou parecença. Ela vem e, num repente, deixa órfãos, dependentes, entristece aos parentes.

     Ela chega e muda tudo sem nada mudar. Eu, por exemplo, não mudei, ainda sou dos que a esperam sem querer encontrá-la. Mas ela chegou e mudou meu estado civil.

     Vou tentar enganá-la pra sempre.

.:: o ::.

     Meu jeito de escrever era uma das coisas que Marta, a mãe dos meus filhos, gostava em mim. Essa foi a forma que encontrei de homenageá-la, agora, quando ela recebeu a visita mal-vinda daquela que todos esperam, depois de muita luta e esperança em adiar sua chegada.

     Descansa em paz, Martinha, zelarei por teu maior legado: nossos filhos.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Telechatos

     Estou mesmo precisando de férias. Ainda bem que isso acontece a partir de amanhã. Bem cedinho, com mulher, cachorra e gata pego a BR 101 direto pra Bombinhas/SC.
     Nesta semana, cheguei à conclusão de que meu nível de estresse tá um pouco alto: pela primeira vez, desde que existe o telemarketing, destratei uma operadora do setor. Vou contar a história.

telechatos

     Tudo começou no último dia 31. Estava eu tentando pegar no sono na minha costumeira sesta, lá pelas duas e meia da tarde, quando toca o celular. A primeira coisa é o susto. A gente está em alfa e, de repente, aquele estardalhaço. Sim, estardalhaço, porque o toque do meu celular é o tema do Globo Repórter. Levantei meio estonteado, coloquei os óculos e, ao ver que a ligação era do código de área 11, deixei tocar até parar.
     Deitei de novo. Daqui a pouco, novamente o estardalhaço. Era do mesmo número. Já que minha sesta tinha ido pro brejo mesmo, atendi pra tentar dar um fim naquilo.

     — Alô!

     — Boa tarde. Aqui quem está falando é Robson. Falo em nome do Bradesco. Gostaria de falar com o seu Aldo Jung (pronuncia-se “iung”, mas eles sempre falam “jung”, com “j”).

     — Sou eu mesmo, Robson, mas não posso falar agora porque estou no trânsito.

     — Qual seria, senhor Aldo, uma melhor hora para estar falando com o senhor?

     — Hoje? Só lá pelas 10 da noite!

     — O Bradesco agradece e lhe deseja uma ótima tarde.

     Claro que eu sabia que ele não ligaria às 10 da noite. Ligou logo depois das sete. Não atendi e, naquele dia, ficou por isso.
     No dia 1º, pela manhã, estou no trabalho e aquele fatídico 11 liga novamente. Atendi. Ficou mudo e a ligação não se completou. Cerca de uma hora depois, toca de novo. Atendi. Ficou mudo e a ligação não se completou. À tarde, naquela horinha que é sagrada pra mim, o Globo Repórter grita de longe: to-óin, to-óin, to-óin,to-óóóóóiiiiin! Dessa vez não atendi e a coisa ficou por aí. Só que a minha sesta foi pro brejo pelo segundo dia consecutivo.
     O drama continuou no feriado do dia 2. Várias vezes, durante o dia, deixei o 11 pendurado, inclusive na hora da sesta. Apesar de ela ter ido pro brejo.
     Ontem, dia 3, pela manhã, resolvi atender. Na primeira vez a ligação não se completou. Na segunda, deu certo.

     — Alô!

     Do outro lado falou a voz metálica, fanhosa, de uma mulher.

     — Boa tarde. Aqui quem está falaaaando é Rose Silva. Falo em nome do Bradesco e gostaria de falar com o seu Aldo Jung.

     — Pois não. Sou eu mesmo, mas não posso falar porque estou dirigindo.

     Cheguei bem perto do condicionador de ar, que estava ligado, para fazer barulho.

     — Poderia repetir, senhor Aldo. Não lhe entendi.

     — Não posso falar porque estou dirigindo – gritei.

     — Qual seria, senhor Aldo, uma melhor hora para estar falaaaando com o senhor?

     — Hoje? Só depois das 19 horas!

     — O Bradesco agradece e lhe deseja um exceleeeente dia.

     Pensa que eles desistem? Que nada! Os coitados têm uma meta diária a cumprir.
     Na tarde daquele mesmo dia, na horinha sagrada da minha sesta: to-óin, to-óin, to-óin, to-óóóóóiiiiin! Lá veio o Globo Repórter me tirar de alfa. E o pior: a ligação não completou. Vi que era o Bradesco de novo. Levei o telefone pra deitar comigo. Não demorou muito, de novo: to-óin, to-óin, to-óin,to-óóóóóiiiiin! E o pior: a ligação não completou. Vi que era o Bradesco de novo. Larguei o telefone do meu lado. Não demorou muito: to-óin, to-óin, to-óin,to-óóóóóiiiiin! Deu certo!

     — Alô!

     Do outro lado falou a voz metálica, fanhosa, de uma mulher.

     — Boa tarde. Aqui quem está falaaaando é Gisleine. Falo em nome do Bradesco e gostaria de falar com o seu Aldo “Iung”.

     — Pois não.

     — Seu Aldo?

     — Sim. E daí?

     — Primeirameeeeente, gostaria de estar lhe informaaaando que essa ligação vai estar seeeendo gravada para sua segurança. Então: blá, blá, blá, blá, blá. Benefícios, blá, blá, blá, blá, blá. Crédito, blé, blé, blé, blé. Blé, blé, blé, blé. Juros baixos, bli, bli, bli, bli. Bli, bli, bli, bli. Bló, bló, bló...

     Antes que chegasse ao blu, interrompi a Gisleine.

     — O negócio é o seguinte, Gisleine: graças a Deus não preciso de crédito. Isso é o que eu mais tenho. Crédito. Tenho cinco cartões de crédito, tenho um ótimo emprego no governo federal, que me garante uma renda excepcional, não passo por dificuldades e não preciso de nada.

     — Quais seriam as bandeiras dos cartões de crédito que o senhor possui, senhor Aldo?

     — Visa, Mastercard, Dinners, American Express e um outro que nem me lembro mais, porque não uso nenhum, compro e pago tudo com dinheiro, na hora.

     — Mas, então, senhor Aldo, vou estar lhe ofereceeeeendo a oportunidade de estar adquiriiiindo mais um cartão de crédito...

     Interrompi a Gisleine de novo.

     — Gisleine...

     — ... blá, blá, blá, blá, blá, blá, blá, blá, blá, blá...

     — Gisleine! – gritei.

     — Pois não, senhor Aldo.

     — No momento não estou interessado em crédito. Mas o que eu tô querendo muito é fazer sexo.

     Um breve silêncio.

     — Poderia estar repetindo, senhor Aldo? Não lhe entendi.

     — Eu tô loco pra fazer sexo, Gisleine, dar uma boa transada. Poderias estar me ajudando com isto?

     — O Bradesco agradece e lhe deseja uma boa tarde.

     Tu, tu, tu, tu, tu...

.:: o ::.

     Fui grosseiro, sei. Fiquei com pena da Gisleine. Faria o mesmo se fosse a Rose ou o Robson, de quem também ficaria com pena. Sei que eles não são culpados, mas alguém tem que ouvir. Se eu pedisse pra chamar o supervisor ou supervisora, não seria atendido se não houvesse uma razão plausível para tanto, mas diria o mesmo pra ele/ela, de quem também teria compaixão. Na verdade, quem tem que ouvir o que eu disse e coisa ainda pior é o Diretor de Marketing do Bradesco e o cara que inventou esse serviço telechato. Esses são os verdadeiros culpados pelas seguidas e vespertinas interrupções da minha sesta.

.:: o ::.

     Posso estar imaginaaaando que o leitor tenha achado meio chato esse texto repetitivo. Imagine, então, como eu estava incomodado. É que tentei passar a impressão daquele papo de telemarketing, que é sempre o mesmo.

     Enfim, estarei de volta no fim do mês e, espero, sem estresse. Mas, como tenho que deixar o celular ligado, então não sei se vou ficar livre dos telechatos...

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

It’s only Rock n’ Roll


     Já comentei neste blog sobre meu hobby do passado (The Old Stones e The Old Stones rides again!). Acho que não comentei que ele continua. Então vamos a um resumo dele no passado.

O passado remoto

     Em 1966, quando tinha 16 anos, formei uma banda de rock com mais três amigos, no embalo da beatlemania. Ela se chamava The Old Stones e eu era o baterista, que não é considerado músico, mas sim o melhor amigo dos músicos. Durou até 1969, quando cada um seguiu seu rumo.
     Passei a ensaiar sozinho, na garagem da minha casa, com o objetivo de me aprimorar. Colocava os discos de bandas da época num toca-discos plugado num potente amplificador, sobra do divórcio dos Old Stones, e os acompanhava na bateria.
     Em seguida, o Buffalo, contrabaixista dos Old Stones, me convidou pra tocar na banda em que ele estava e que se chamava The Hooligans (não sei se o nome tinha alguma referência com os violentos torcedores ingleses, mas era soava bem rock n’ roll). Mas, como tudo acaba, essa também acabou. Com alguns remanescentes e novos integrantes, formou-se a The New Hooligans, que também acabou depois de um tempo.
     Não demorou muito, eu e um remanescente da TNH formamos outra banda, mais pesada, com mais pegada e uma batida forte, à qual demos o nome — pasmem — de Banda do Pentágono da Paz (nossa!). A essa altura já era final de 1971 e a banda, como as outras, foi pro saco.
     Foi então que entrei numa banda chamada Kaos (não me lembro se era com K ou com C). Essa tinha pretensão de crescer e fazer muito sucesso, mas seus integrantes não tinham recursos suficientes para adquirir os bons equipamentos necessários. Para conseguir isso, a banda começou a tocar num inferninho da Cristóvão Colombo, perto da Gaspar Martins, chamado Pyramides Club. Era um horror. Tocávamos pras putas da casa dançarem com seus pretendentes. Não se suportava nem o cheiro do local. Eu trabalhava, tinha um salário razoável e estava prestes a me casar, então acabei caindo fora.
     Era 1972. Dei por encerrada minha carreira de músico e vendi minha bateria pra um colega de trabalho.

O passado recente

     Eis que 24 anos depois, o Buffalo, antigo companheiro, resolveu reunir os Old Stones para uma brincadeira: queria comemorar 30 anos dede que tínhamos tocado juntos pela primeira vez. Topamos. Assim, em outubro de 96, os velhos stones tocaram juntos de novo, num jantar dançante no Partenon Tênis Clube. A casa lotou com antigos e antigas fãs, quase todos já com os cabelos agrisalhados.
     Talvez você já tenha ouvido alguém dizer que música é como cachaça: não pode tomar o primeiro gole. E foi o que aconteceu. Os Old Stones continuaram na estrada por algum tempo, com diversas formações, tocando em jantares dançantes e fazendo shows em praças e parques, mas como um saudável hobby.
     Um ditado diz que a fruta nunca cai longe do pé. Meu filho também montou uma banda com colegas do colégio. Não era de rock, mas sim de pagode (acho que atirei pedra na cruz em encarnação passada). Tudo bem. Como pai tem que participar, levava-o para os ensaios, que já não são mais em garagens como no meu tempo, mas sim em estúdios. Num desses, o dono também tinha sido músico na adolescência e havia voltado a tocar depois de maduro (vou evitar o termo “velho”), mas que, como eu, estava parado. Conversa-vai, conversa-vem, convidou-me pra fazer com ele uma banda.
     Eu e os outros convidados, a quem eu não conhecia, aparecemos no dia marcado. Feitas as apresentações, fomos para o estúdio e fizemos um som bem legal, por cerca de duas horas. Na saída, conversamos uns com os outros sobre o passado, em que bandas, quando e com quem havíamos tocado. Dirigi-me a um deles, gordo e quase careca, e disse que tinha tocado numa banda do IAPI, chamada Kaos, com fulano, sicrano e o Cabeleira...
     Ele me interrompe e diz: — Pô! O Cabeleira era eu!
     Ou seja: o tempo foi implacável com ele, a ponto de, além de transformar seu corpo, afetou-lhe a memória, pois não me reconhecera. E eu nem mudei tanto naqueles pouco mais de 30 anos, apenas não sou mais cabeludo, mas continuo magro. Ele, naquela época, era mais magro do que eu e tinha uma vasta cabeleira crespa (daí seu apelido).
     Mas isso foi apenas um detalhe. Essa banda durou poucos encontros e não vingou, justamente por causa do Cabeleira, que tinha uma vida meio complicada. Em compensação, o outro integrante que conheci nesses encontros, o Nelson, me convidou para formar uma banda com ele. Juntamos, então, metade dos antigos Old Stones com metade dos antigos Os Bruxos, que era a banda do Nelson na adolescência, e nasceu o Projeto 70.
     O Projeto 70 foi eterno enquanto durou, assim como as paixões e alguns amores. Novamente este melhor amigo dos músicos que lhe escreve estava no ócio musical. Num belo dia, encontro no supermercado o Gil, aquele cara do estúdio em que meu filho ensaiava e que quis fazer a banda com o Cabeleira e o Nelson. Estava tocando numa banda que passava por modificações e precisava de um baterista. Lá fui eu tocar na Escravisaura Blues Band.

O presente

     Por falta de tempo de alguns, a Escravisaura ficou na berlinda. Enquanto isso, eu e o Gil formamos a Folk’n’Roll, que existe desde 2006.
     A Folk'n'Roll toca músicas dos anos 60 e 70, sem que tenham sido, obrigatoriamente, tops de paradas de sucesso e que, normalmente, não são tocadas por grupos semelhantes. A interpretação tem uma levada às vezes folk, às vezes country e, na maioria das vezes, a batida do rock daquelas décadas. Não existe a preocupação de fazer covers dos originais. A Folk'n'Roll coloca pitadas de banda de garagem na interpretação do seu repertório. A proposta é executar músicas do gosto pessoal dos integrantes, mas que também transportem seu público àquela época. Para os mais novos, porém, tudo soa como se fosse novo.
     O grupo é formado por músicos experientes, que, como eu, encaram a atividade como um hobby: Aldo - bateria e backing vocals; Aloar - guitarra solo e backing vocals; André - teclados; Gil - contrabaixo e vocais; Lauro - guitarra base e vocais.
     Do set list da Folk'n'Roll constam músicas de Barry McGuire, Beatles, Bee Gees, Billy Ray Cyrus, Bob Dilan, Byrds, Eric Clapton, Marmalade, Monkees, Nillson, Rokes, Rolling Stones, Shakers, The Five Americans, Turtles, Ventures, Willie Nelson e outros.
     Conheça melhor a banda e ouça músicas interpretadas pela Folk’n’Roll no site, clicando aqui. Abaixo, um vídeo gravado com uma máquina digital numa festa privada.
    
 
     O bom de ser baterista, isto é, ser o melhor amigo dos músicos, é que a gente tem um monte de conhecidos músicos. Há pouco mais de um ano, recebi um telefonema de um cara que se identificou como Ricardo, que me conhecia da época dos Old Stones. Disse que quem dera meu número pra ele fora o Carlos (o Português, dos Old Stones). Ao se identificar, disse que também tinha uma banda naquela época, assim, assado, etc. e tal. Resumindo: queria que eu conhecesse uma turma que estava se reunindo havia algum tempo, mas que não tinha baterista (ou seja, a turma não tinha um “melhor amigo”).
     No dia combinado, apareci na casa desse cara, que eu desconfiava quem fosse. E era ele mesmo, o Tati, irmão do Fred, que estudava comigo no Colégio Batista. Inicialmente ele queria que eu levasse a bateria. Argumentei que era muita coisa só pra um encontro que nem se sabia se iria dar certo. Um dos outros caras, contudo, levou um arremedo de bateria, mas que dava pra fazer barulho.
     E como fizemos barulho! Foi paixão à primeira vista. No grupo tinha (e ainda tem) dois guitarristas fantásticos (Richard e Cristiano), um contrabaixista de primeira (Ivo), o Tati, que toca violão e canta, e o Hespanhol, que, naquela época, era tecladista. Tinha, ainda, um cara que tocava harmônica, o Rafael, filho do Fred e, consequentemente, sobrinho do Tati, mas que não apareceu naquele dia (nem nos subsequentes, apenas nas apresentações. Hoje está fora do país).
     Assim começou minha vida de baterista com aquela banda, chamada Alpha Rock. Posso dizer que praticamente começou a vida da banda, porque, até então, haviam feito poucas apresentações. Com meus conhecimentos, consegui levar a banda pra tocar no Sgt Peppers — a meca das bandas de rock de Porto Alegre —, que deu ainda mais motivação praquela gurizada detonar o rock n’ roll.
     Diz a história que tudo começou com o nome “Joh Free Band”. No final dos 90, um baterista e um violonista, dispostos a encontrar alguém que realmente soubesse tocar, publicaram no jornal um anúncio classificado procurando um guitarrista. Atendendo ao anúncio, Cristiano Marchionatti junta-se ao violonista Ricardo Forneck e ao baterista da hora.
     Em 2001, indicado por um amigo de Ricardo, agrega-se ao grupo o baixista Ivo Silveira. O tempo passa. Músicos passam e se vão, mas o trio Ricardo, Cristiano e Ivo mantêm-se firme.
     Em 2003, o guitarrista Richard Hennig se junta aos encontros daquele trio formado por violão, guitarra e baixo. Nascia, então, a “Alpha Rock”. Nem se podia dizer que a banda era completa, pois nenhum baterista esquentava lugar. Um dia, Ivo convocou seu filho, Diego “Beselho” Silveira, para, finalmente, assumir as baquetas.
     Mais tarde, Ricardo e Richard conheceram o tecladista PC Hespanhol e o convidaram para participar da banda. O convite foi aceito na hora.
     Por motivos de estudos e trabalhos, Diego precisou desligar-se do grupo. Outra vez a banda passou por momentos críticos, convocando e testando outros bateristas, que não se enturmaram. Novamente por indicação, surgiu meu nome, de quem os demais gostaram e que também gostou da banda.
     Quando a banda começou a tocar no Sgt Peppers, Revolution, Free Riders e outros pubs, amigos que a acompanhavam gravavam vídeos e os colocaram no Youtube. Ao se pesquisar por Alpha Rock, no entanto, aparecia outra banda com o mesmo nome, de outro Estado. Sugeri, então, que se mudasse o nome.
     Agora, a Alpha Rock tem outro nome, “the” rock band, e continua tocando o mais puro, bom e velho rock'n'roll! Confira no site, clicando aqui.
     A formação atual conta com Ricardo Forneck (violão e voz), Cristiano Marchionatti (guitarra e voz), Richard Hennig (guitarra e voz), Ivo Silveira (baixo), e Aldo Jung (bateria).
     Abaixo, um vídeo gravado no Sgt Peppers.

     It’s only rock n’ roll, but I like it!